Presos em triângulos rosas

Presos em triângulos rosas

Acredito, sou muito mais do que aquilo que dizem sobre mim ou impõem para que eu seja. Não me curvo ante regras com as quais eu discordo e que não são compatíveis com o que penso acerca do mundo. Meu mundo, o mundo no qual vivo, é muito mais amplo e possui mais horizontes multicolores do que se pode imaginar. Apesar de mostrar-me forte a todo o momento, não posso negar que sou tão frágil quanto vidro fino e estou à mercê de rotulações, ‘stupid labels’, originadas a partir de observações terceiras e errôneas, como se eu tivesse eternamente presa ao braço um triângulo rosa que diz o que sou, o que devo fazer, e o que penso, mesmo sem que a minha boca se abra. Bem, isso trata-se de um pré-julgamento baseado em fundamentos religiosos ou sociais equivocados, porém com os quais não posso brigar. Sou fraca, também sei, e certamente, sairei como uma perdedora na luta contra o fanatismo religioso, ainda que eu esconda o meu triângulo rosa (invisível) que insistem em prender ao meu braço direito. Durante a Segunda Guerra Mundial, símbolos foram usados, nos campos de concentração nazistas, para identificar os prisioneiros sem que eles precisassem abrir a boca para se apresentar ou se defender. Literalmente, calava-os e rotulava-os. Judeus recebiam o triângulo azul, fixado no braço, lésbicas, o preto, e gays, o rosa. Apesar de tal acontecido estar guardado no passado tenebroso da nossa história, ainda hoje esses triângulos permanecem presos em nossos braços. Percebem-os? Somos pré-julgados o tempo inteiro pelo que ouvimos, pelo que vestimos, pelo que falamos, por com quem andamos, por quem adoramos e por quem odiamos. Olham para nossos "triângulos" e, de imediato, temos nossos perfis traçados, sem nem mesmo trocarmos uma palavra com quem nos observa.

E foi por causa desse pré-julgamento, por uma religião extremista e um tanto fanática, que o show da Born This Way foi cancelado na Indonésia, sob a acusação de Gaga ser uma “má influência” para os jovens do lugar. No entanto, entendo que ser suscetível a influências é a prova cabal de que minha educação, em casa, foi falha e que meu caráter estará eternamente em formação, talvez por morar num lar onde a liberdade é pouca e tudo o que penso está sujeito a dogmas religiosos (atestado de incompetência familiar). Se sei o que sou, nunca me deixarei influir por aquilo que não concordo. Apesar de o comentário ser recorrente, devemos nos erguer contra qualquer ação de censura, e o pior, censura contra a arte. Talvez seja de arte “imoral” que o mundo islâmico precise para compreender o tanto de imoralidades que cometem todos os dias ao ceifar vidas inocentes com bombas e tiros, numa disputa desumana que já perdeu o propósito com decorrer dos tempos. Nem lembram mais por qual razão degladiam-se, matam uns aos outros. Para mim, não há maior prova de imoralidade e de perigo iminente contra a vida quanto esse. Não obstante com a tristeza que se apossa de mim pelo cancelamento do show na Indonésia, por saber que milhares de fãs no país não poderão assistir às performances de Lady Gaga, deixo que o silêncio se estenda, pois ainda que eu brade, enquanto houver fanatismo religioso, pré-julgamento e pré-conceito, estarei eternamente presa em meu triângulo rosa, sem liberdade, sem vida, sem nada. Presa pra sempre. É desolador tentar compreender isso.